segunda-feira, 2 de março de 2009

Fragmento n°1



"Ela sim enxerga mar em copos d'água."

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Melfinete


E eu vou buscar.
O que não foi dito.
Que voa pro céu,
Mergulha no mar.

Tava lá minha alma, ó.
Lá no meio-fio.
E quando injetei a minha vida na veia.
Eu já não sinto mais frio.



terça-feira, 2 de dezembro de 2008

...


E como somos um, embora dois, vivemos em uma vida, o dobro do tempo.




segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

AS BORDADEIRAS (DRAMATURGIA CURTA)


(Bordadeiras. Hábeis mãos que tecem estórias.)

Neide: Era valsa!
Agripa: Não, num era valsa.
Neide: Uma valsa! Tenho certeza, Dourival que é cunhado da Jossi, sabe a Jossi? Aquela filha da Dona Lurdes. Peor. Dourival viu e me contou.
Agripa: Eu tava lá Neide, vi tudo. Não era valsa. Para de morar com a teimosia.
Neide: Oh, Cristo Jesus! Que tanto querer ser dona de todas as razões no mundo. Já ta véia pra ficar cheirando coco de vaca. (Ri)
Agripa: Na flor véia, a ultima coisa que morre é o espinho. (espeta Neide com agulha)
(...)

Neide: E funcionou?
Agripa: O que?
Neide: A valsa!
Agripa: Não era valsa!
Neide: Que seja. Funcionou?
Agripa: Dum certo sim e dum outro as coisas ficam um pouco mais neblinada. Mas que era moço bonito era. Ô! Se tivesse uma eleição duns homis bonitos no mundo, esse com certeza era o segundo!
Neide: Segundo?
Agripa: É! O Primeiro é Zino, meu marido. Que Deus tenha. Virou reza. Mas esse era bonito, dava vergonha até.
Neide: Ah. Mas a moça não ficava passo atrás. Titinha até no nome já se saltava. Titinha! Juca filho de Fernanda, sabe Fernanda? Aquela que mora perto, no Onça. Peor. Juca chorava amor todo dia por ela. Pergunta se deu renda?
Agripa: Deu renda?
Neide: Deu nó!
Agripa: Pois é, sempre da dó.
Neide: E que deu do homem bonito com Titinha?
Agripa: Xi. Ficava só olhando pelos furo da cortina. Todo dia, depois da batida do final de tarde, ele passava. Já diviam ter se reparado há tempos, pois sempre ele passava posando. Me ria. Quadra e meia pra cima onde a janela dela não chegava, via sempre que ele parava e se engomava todinho, até os pelinho dos dedo ele penteava. De certo, ele jogava poses e ela sorrisos.
Neide: Aix. Ó! Até arrepia!
Agripa: Ficaram assim até que ele inventou as flores. De tempos, ele começou a parar a tropa em frente a janela dela com uma flor, cada dia de uma certa cor. Quando tinha certeza que ela via, despetalava a flor e.
Neide: Comia! Pétala por pétala. Só não comia o cabo. Ouvi dizer. Junin que era primo de consideração de um amigo de cachaça do tal moço, me disse que o amigo disse que ele fazia isso pra preparar o beijo. Dizia que só ficaria de mel com Titinha e mereceria seus beijo se a boca dele fosse pura de maldade e exalasse igual as frô.
Agripa: Óia. Que essa parte eu já num sabia. To besta!
Neide: Diziam. Continua.
Agripa: Com o passar dos tempos as coisa se embunitava de vez. Ela começou a se vestir de mais linda do que era, todos os dias, só pra ver ele passar. Cada dia um detalhe novo. Um brinco. Um colar. Um perfume. Vestido por cima de vestido.
Neide: Mire. Pra um homem que só se viu passar pela janela, nunca se conversando.
Agripa: Não deu um mês. Um mês? Menos, cada dia novo dia. Chegou num ponto em que se não podia mais de agüentar. Ele já começava a trazer um buquê inteiro de flores pra comer na frente dela. E ela já se vestia de uma única vez, todas as peças do guarda-roupa, passava todos os vidros de perfume e se usava todas as tintas disponíveis na cara.
Neide: Exagero?
Agripa: Nada. Eles tavam juntando amor. E quando ele, o amor, se atingiu nos estágio mais alto de se agüentar. Um só peito é pouco. Aconteceu a noite em questão.
Neide: Da valsa!
Agripa, olha feio: Da serenata! Tava noite de lua completa e eu que nem nada mais esperava a não ser o sono. Lá do fundo eu me pus a escutar... (cantam uma musica, que vai subindo de volume ao poucos) Tava ele lá, lindo. Fecho a rua com um chão de flores.
Neide: Não exagera, cubriu só o chão da carroça.
Agripa: E ela se vestiu com todas as roupas, de todos os guarda-roupas, de todas as vizinhas da rua.
Neide: E você ta vestindo o que agora? Não era todas?
Agripa: Ele jogou um beijo, e ela se deixou atingir. Deu passos de chuva pela rua, o que deixou ela toda molhada. Todo cheio ele, nunca que parava de cantar. Na frente da janela, ela estendeu a mão. Se tocaram pela primeira vez e se sumiram. Palavra nenhuma disseram não, pelo menos não que eu tivesse ouvido. Deixaram só pra falar com as orelhas. E baixo, bem baixo.
Neide, encantada: E o resto?
Agripa: O resto? Não se sabe. Trancaram a janela e lá ficaram. Inté hoje. Nunca que saem.
Neide: Eita. E comem o que?
Agripa: Amor, Neide. Come amor.
(...)
Neide: Agripa?
Agripa: Hum?
Neide: Será mesmo que não era valsa?

(Cantam)

Leandro D'Errico

sábado, 22 de novembro de 2008

CLOUD MALLET


Bruxelas, 1946


Entrei numa dessas casas de favores em Bruxelas, eu era de leite e pólvora mas entrei mesmo assim. Sentei lá com dois amigos que tavam junto de viagem. E assim. Era tudo luxo naquela época, tudo veludo, um velho tocando piano, tudo de velas, cheiro de armário… Lembro de nem sequer ter pedido direito alguma coisa pra beber e tudo aconteceu. Ekaterina, não era o nome dela de verdade, mas pra mim servia. Veio se abanando e olhou pra mim. [risos] Minha vó dizia que no amor as retas todas são um tanto mais curvadas. [sussura] Ela era uma moça sem respeito! [me olhou pedindo segredo] E linda. Nem virou os olhos, olhar direto-direto. Ela era toda vermelha, do vestido até o sangue. Toda assim, sabe? Ah, esqueci de contar, eu não queria ir não, por pouco que eu não ficava no hotel, o Collet que me arrastou! Ainda bem, o safado. Ia me arrepender. A Ekaterina sentou assim como que você ta aí. Só que numa cadeira de frente assim, não virou os olhos nem um segundo e me disse:

EKATERINA : Se você disser que tem, eu tenho. Se você disser que vai, eu vou. Se você disser que dá, eu do!*

Elas tinham uma frase pronta pra se apresentar, fui descobrir isso depois só.

CLOUD: Obrigado, nós viemos só pra beber.

EKATERINA: Eu também.

CLOUD: A dama não trabalha aqui?

EKATERINA: Se você quiser que eu trabalhe, eu trabalho.

Deu até tremedeira na hora. Mas naquela época a mulher tinha que tá no lugar dela, inda mais sendo prostituta [risos]. Aí brinquei.

CLOUD: Eu não preciso pagar para ter…

EKATERINA: Nem eu.

Aí. Você é jovem e ainda não sabe dessas coisas. Mas eu olhei lá no fundo do olho dela e vi o outro lado. Isso que eu vou dizer você não vai entender, mas as pessoas tem avessos, e a coisa mais dificil de se fazer é dobrar elas. Eu vi a outra Ekaterina e me mijei todo.

CLOUD: Você é bela. Inteira. Com todo respeito, digo isso a senhorita.

Dizer que tem respeito por uma moça sem respeito é fulminante. Não esqueça isso, não! Ela desmontou inteira e começou a chorar, no meio do lugar. E o piano lá. A maquilagem foi inteira e ela continuou vermelha, mas por outros motivos. E aí que se deu o arremate…

EKATERINA: Para ter você, eu não teria coragem de cobrar!

CLOUD: Para ter você, eu até teria coragem de pagar!

[Ele sorriu malicioso] Depois de tudo ela largou a vida sem honra. [ri] Ficou uns anos assim, sabe? Foi indo longe, longe. Tirou o vermelho… e depois de muito tempo virou princesa! [Princesa?] É salvei! Por causa daquele dia meu com ela, aqueles lados de lá teve ela, ela virou a princesa de Ligne! A gente deve ter cuidado quando fala que uma mulher é bonita de verdade, elas vão longe depois disso!

Cloud Mallet

****
Cômicamente, depois de pesquisar pra caralho fui descobrir que a “Ekaterina” em questão na verdade se tratava (De acordo com as informações de Cloud) da Princesa de Ligne, Alix Marie (vide google) que casou-se em 1950 com o Príncipe Antoine. As datas não batem, nem os eventos, somente a imaginação de Cloud, o salvador de Ligne!



domingo, 2 de novembro de 2008

BOBA LOCA


Boba Loca
, também chamada de “Bubble Tea”, é uma espécie de bebida originada em Taiwan na década de 80 e se espalhou pelo mundo desde então. A tradução literal do Chinês é “o leite de pérolas” (traditional Chinese: 珍珠奶茶; Tongyong Pinyin: jhenjhu nǎichá; Hanyu Pinyin: zhēnzhū nǎichá). Consiste em uma bebida refrescante de sabores variados, servida com tradicionais bolas de tapioca gelatinosas do tamanho de bolinhas de gude. A palavra “Boba” (Bubble) se refere na verdade ao efeito borbulhante da bebida ao ser preparada e não, o que muitos pensam, em relação às atuais bolas de tapioca (também chamadas de “pérolas”). A Boba Loca, é consumida com grandes canudos para facilitar a sucção e atualmente é extremamente popular em toda a Asia e países como EUA, Canada, Austrália, Nova Zelândia e Perú. Além de ser ruim pra caralho.


Receita para cozinhar a Boba Loca:

*Ponha água em uma panela e deixe ferver. (Seis partes de água para uma de Boba)
*Coloque a Boba na panela e cozinhe por 30 minutos sem cobrir.
*Agite ocasionalmente para evitar da boba grudar e continue agitando até que ela começe a flutuar.
*Remova do calor e deixe descansar com a tampa coberta por 10 minutos.
*Use uma peneira para drenar a água e depois lave abundantemente com água fria toda a boba. Repita o processo.
*Adicione a receita de bebida de sua preferência e está pronto para servir. Aprecie!



sábado, 25 de outubro de 2008

A TRACINTAGEM


“Vai ser chato”. – Disse alguém na fileira do fundo, e sempre haverá alguém na fileira do fundo.
Não se pode mais hoje em dia perder tempo bordando toalhas ou praticando tracintagem. Eu que, por exemplo, quando uso óculos, durmo sem escovar os dentes já que as lentes de contato me forçam a ir ao banheiro. E disse Hugh Bouix em seu livro “O manifesto do ouro de barro” (Ed. Zafra - página 87):

“Quando fui pela primeira vez aprender a atirar flechas em um alvo, tremi de cima para baixo, não pelo medo, mas pelo peso em carregar a flecha no arco. Tinha 12 anos e me lembro que esse mesmo arco media praticamente a minha altura, e até hoje duvido se não se igualava também em peso (sempre fui muito mirrado, demérito meu e sorte do arco). Eu odiava, arrependi-me profundamente quando preteri críquete e esgrima e optei pela modalidade (Era tolo, assisti há um filme de arqueiros do “Ferroni” e julguei romântica a condição). Desistências não eram aceitas pela instituição, eu deveria cursar durante todo o ano letivo com desempenho acima do satisfatório. Malditos sejam os burocratas.
Gastei o meu ano treinando firme em acertar o tal alvo, e nunca consegui acertar duas vezes consecutivas o centro, sinônimo óbvio de sorte quando o fazia. Chorava copiosamente e quase fora expulso diversas vezes por ofender a mãe e as sucessivas gerações dos meus instrutores; mas embora esbravejasse, permaneci firme, honrando as minhas decisões de homem.
No fim do ano, já me encontrava quase a beira do colapso (Sonhava semanas seguidas com o maldito centro vermelho) quando fui informado que haveria uma competição entre as instituições da costa da leste. Nesse ponto em minha vida, eu tive algumas certezas, uma delas é que o destino é sarcástico e faz de tudo pra curtir uma com a sua cara; fui convocado para os jogos, mesmo sendo terrível.
Caro leitor, nesse ponto os senhores já podem esperar pelo inesperado. O mesmo destino que curtia uma com a minha cara veio para nos brindar com um milagre. Lembrei-me novamente dos filmes do Ferroni quando vi a multidão aguardando a minha primeira tentativa. Nunca na vida me recordo de desejar tanto ter sucesso. Preparei o arco com cuidado e pela primeira vez me senti confiante, dentro de mim já morava a certeza em acertar o centro antes mesmo de acertá-lo. Nós temos sensações assim às vezes não temos? A platéia se calou e eu atirei triunfante… A flecha atingiu a borda do alvo, por muito pouco nem sequer o alvo eu acertei. Subiram gargalhadas de todos os lados e eu fiquei ali desapontado falando entre dentes “esperem só o meu próximo”. Também não acertei o próximo que novamente fora ridículo, e nem o próximo, e nem o próximo. No final da competição eu figurava o ultimo lugar astronomicamente atrás dos outros competidores. Então o leitor se pergunta: Sim, mas e o milagre?
No meu ultimo tiro resolvi tirar o peso de minhas costas, é isso que fazemos quando estamos exaustos de algum jogo. Coloquei em minha cabeça que aquele centro vermelho não era mais o meu objetivo e que aquele tiro seria finalmente, de minha autoria. Às vezes as coisas dão certo quando “largamos a mão” e deu (Lembre-se de que este não é um livro de auto-ajuda e também não estou relatando os sucessos de minha existência). Eu errei completamente o alvo e minha flecha acertara um dos juízes da prova. Encontrei naquele instante minha verdadeira finalidade com o arco, saí atirando flechas na platéia.
Tive sorte de ter sucesso nas outras atividades que me dediquei na vida, pois o arco me rendeu a expulsão da instituição e a minha primeira passagem pela polícia em plenos 12 anos de idade. No dia ainda fui condenado a prestar serviços comunitários depois de mandar o policial enfiar a “moral da história” no cu dele. O sucesso negro.”


Em 1937, “Robert Piccles” inventava a tracinta (o ato de escrever idéias em paredes dentro das casas) enquanto o mundo se agitava. A poesia brotava, graças a ele, em chamas que rodavam ao redor do mundo e voltavam ao destino com filtros dos quatro cantos, eficácia invejável até mesmo para a moderna internet. Sua luta se concentrava justamente contra o “sucesso negro” de Hugh Bouix com o qual tinha agudos atritos. Aliás, para Piccles, os modernos conceitos do sucesso (seja ele branco ou negro) ou fracasso já estavam na época ultrapassados:

“Nossa alma é feita de sucessos e fracassos em sua natureza, não é possível desvinculá-las. Onde se concentra então nossas medidas de valor? Na nossa biografia? Nos nossos atos quotidianos ou projetos? Não se pode confundir o sucesso com a fama ou reconhecimento e nem o fracasso com derrota. Somos sim, alma. De peito aberto e sangrando. Somos o extremo sucesso e o extremo fracasso do agora, no tempo que nós é real, e só assim somos verdadeiramente completos”
[Esta é uma das tracintas de Piccles que correu as paredes do mundo]

De grave fato bonito a tracinta voou (sem ^ de acordo com as novas regras ortográficas) longe. E mesmo aqueles que estavam praticamente sem vinculo com a informação riscavam nas paredes suas idéias. Escreviam com o que se tinha à disposição, há tracintas escritas desde carvão à fios de ouro. Loucos. Pediam o dobro, o triplo do valor do imóvel informando ao comprador que as paredes da casa estavam cobertas por idéias. Pessoas até, que ao se mudar, não conseguiam se desvencilhar emocionalmente e levavam consigo as paredes para a nova casa. Não consegui descobrir em minha pesquisa se pagavam pela casa as quantias adicionais pedidas, mas é fato que a idéia era cercada de bom humor. Até os mais românticos diziam ser sinal de boa sorte, viver em uma casa de idéias.
É fato também que casas que recebiam viajantes trazendo a tracintagem de paredes de outros lugares do mundo enobreciam as casas (pratica que se popularizou agudamente). E as mesmas se tornavam invejadas na vizinhança, pois quem possuía mais o conhecimento em sua casa gozava de mais “enobreza”. Em eventos sociais, como festas e jantares, era comum convidar amigos para propor debates e discussões sobre as idéias nas paredes (mais um sinal da importância em ter uma boa coleção).
A pratica sobrevive ainda hoje, muito mais timidamente é fato ou até transformada (como em banheiros publicos, mesmo que seus dizeres, por muitas vezes interessantes, fiquem longe dos fios de ouro do passado e figurem entre mensagens pornográficas). A tracintagem mostra que um outro tipo de riqueza é o que se buscava, e este foi um dos primeiros passos “Tecnológicos” (se é que podemos chamar assim) para a troca de ideais filosóficos entre vizinhos e nações, nessa “pichação interna”.
Em relatos, Piccles se dizia concordar com somente um ponto de Bouix: “Gostei quando ele mandou enfiarem a moral no cu. Temos que realmente implodir tudo, quem sabe até as paredes”

As Duas Regras Básicas da Tracintagem:

• NA ESCRITA, OBEDEÇA A SUA NATUREZA.
• PARA PASSAR UMA TRACINTA, É NECESSÁRIO PRIMEIRAMENTE TÊ-LA ESCRITA EM SUA CASA.

*Vou pesquisar mais sobre o tema e "posto" mais coisas.

Leandro D’Errico