sábado, 22 de novembro de 2008

CLOUD MALLET


Bruxelas, 1946


Entrei numa dessas casas de favores em Bruxelas, eu era de leite e pólvora mas entrei mesmo assim. Sentei lá com dois amigos que tavam junto de viagem. E assim. Era tudo luxo naquela época, tudo veludo, um velho tocando piano, tudo de velas, cheiro de armário… Lembro de nem sequer ter pedido direito alguma coisa pra beber e tudo aconteceu. Ekaterina, não era o nome dela de verdade, mas pra mim servia. Veio se abanando e olhou pra mim. [risos] Minha vó dizia que no amor as retas todas são um tanto mais curvadas. [sussura] Ela era uma moça sem respeito! [me olhou pedindo segredo] E linda. Nem virou os olhos, olhar direto-direto. Ela era toda vermelha, do vestido até o sangue. Toda assim, sabe? Ah, esqueci de contar, eu não queria ir não, por pouco que eu não ficava no hotel, o Collet que me arrastou! Ainda bem, o safado. Ia me arrepender. A Ekaterina sentou assim como que você ta aí. Só que numa cadeira de frente assim, não virou os olhos nem um segundo e me disse:

EKATERINA : Se você disser que tem, eu tenho. Se você disser que vai, eu vou. Se você disser que dá, eu do!*

Elas tinham uma frase pronta pra se apresentar, fui descobrir isso depois só.

CLOUD: Obrigado, nós viemos só pra beber.

EKATERINA: Eu também.

CLOUD: A dama não trabalha aqui?

EKATERINA: Se você quiser que eu trabalhe, eu trabalho.

Deu até tremedeira na hora. Mas naquela época a mulher tinha que tá no lugar dela, inda mais sendo prostituta [risos]. Aí brinquei.

CLOUD: Eu não preciso pagar para ter…

EKATERINA: Nem eu.

Aí. Você é jovem e ainda não sabe dessas coisas. Mas eu olhei lá no fundo do olho dela e vi o outro lado. Isso que eu vou dizer você não vai entender, mas as pessoas tem avessos, e a coisa mais dificil de se fazer é dobrar elas. Eu vi a outra Ekaterina e me mijei todo.

CLOUD: Você é bela. Inteira. Com todo respeito, digo isso a senhorita.

Dizer que tem respeito por uma moça sem respeito é fulminante. Não esqueça isso, não! Ela desmontou inteira e começou a chorar, no meio do lugar. E o piano lá. A maquilagem foi inteira e ela continuou vermelha, mas por outros motivos. E aí que se deu o arremate…

EKATERINA: Para ter você, eu não teria coragem de cobrar!

CLOUD: Para ter você, eu até teria coragem de pagar!

[Ele sorriu malicioso] Depois de tudo ela largou a vida sem honra. [ri] Ficou uns anos assim, sabe? Foi indo longe, longe. Tirou o vermelho… e depois de muito tempo virou princesa! [Princesa?] É salvei! Por causa daquele dia meu com ela, aqueles lados de lá teve ela, ela virou a princesa de Ligne! A gente deve ter cuidado quando fala que uma mulher é bonita de verdade, elas vão longe depois disso!

Cloud Mallet

****
Cômicamente, depois de pesquisar pra caralho fui descobrir que a “Ekaterina” em questão na verdade se tratava (De acordo com as informações de Cloud) da Princesa de Ligne, Alix Marie (vide google) que casou-se em 1950 com o Príncipe Antoine. As datas não batem, nem os eventos, somente a imaginação de Cloud, o salvador de Ligne!



9 comentários:

  1. Caralho mano! e onde vc conheceu esse cara?

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  2. Resumindo, nunca chame seu amor de linda.

    ...ela vai te largar e casar com um principe por ai!

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  3. Bonito isso: "Para ter você, eu não teria coragem de cobrar!" - "Para ter você, eu até teria coragem de pagar!"... ai... é putanheiro mas é bonito... ai....

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  4. "mas as pessoas tem avessos, e a coisa mais dificil de se fazer é dobrar elas. Eu vi a outra Ekaterina e me mijei todo.

    CLOUD: Você é bela. Inteira. Com todo respeito, digo isso a senhorita"

    - JG Rosa.

    O mais engraçado é que eu li seu texto escutando "O Mundo é Um Moinho", Cartola.

    Abraços

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  5. Putzz..muito bom!
    Gostei do blog,de verdade mesmo!=***

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  6. BRUXELAS??? Existem pessoas em BRUXELAS?? rssss

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  7. dizer que tem respeito por uma moça sem respeito e fulminante.

    dizer da sua diferença entre as milhares de outras moças tambem.

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